Quem você diz que Jesus é?
11 de setembro de 2016
Não há questão mais importante do que a que Jesus fez a seus discípulos (Mt 16.15): “Quem dizeis que eu sou?” Nenhuma questão foi mais intensamente debatida, completa e parcialmente mal entendida, ignorada com grande risco e respondida corretamente com grande benefício do que essa. A resposta correta para essa pergunta é, em alguns aspectos, simples o bastante para salvar uma criança, mas também complexa o bastante para manter os teólogos ocupados por toda a eternidade. Se a vida eterna é conhecer a Jesus Cristo (Jo 17.3), então não podemos nos dar ao luxo de sermos ignorantes sobre aquele que é “o mais distinguido entre dez mil” (Ct 5.10).
Pedro confessou Jesus como o “Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mt 16.16). João falou de Jesus como “o Verbo” que se fez carne (Jo 1.14). Paulo descreve Jesus não só como “a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação” (Cl 1.15), mas também como “Cristo Jesus, homem” (1Tm 2.5). Da mesma forma, o autor de Hebreus identifica Jesus tanto como “o resplendor da glória” (Hb 1.3) de Deus quanto como aquele que participou de carne e sangue (2.14). Depois de tocar em Cristo, Tomé memoravelmente confessou Jesus como seu “Senhor” e seu “Deus” (Jo 20.28). No Antigo Testamento, Isaías teve uma visão de Cristo em que o chama de “o Rei, o Senhor dos Exércitos” (Jo 12.41; ver Is 6.5), mas também chamou este Rei de servo do Senhor, que não tinha “nenhuma beleza que nos agradasse” (Is 53.2).
Jesus também tinha muito a dizer sobre si mesmo. No evangelho de João, lugar das conhecidas afirmações “Eu sou”, ele refere-se a si mesmo como o “pão da vida” (Jo 6.48), “a luz do mundo” (8.12), “a porta” (10.9), “o bom pastor” (10.11), “a ressurreição e a vida”(11.25), “o caminho, e a verdade, e a vida”(14.6) e “a videira verdadeira” (15.1).
Em outras passagens, Jesus é chamado de mestre (Mc 1.27), profeta (Mt 21.11), filho de Davi (9.27), servo (12.18), Filho do Homem (12.8), Senhor (14.30), Cordeiro de Deus (Jo 1.36), Santo de Deus (6.69), o Princípio (Cl 1.18), sumo sacerdote (Hb 5.1-10), aquele que vive (Ap 1.18), Libertador (Rm 11.26) e a brilhante Estrela da manhã (Ap 22.16).
A essa impressionante variedade de nomes e descrições bíblicas poderiam ser acrescentadas muitas outras; na verdade, muito mais do que podemos pensar ou imaginar. Contudo, essas declarações múltiplas da pessoa de Cristo nem sempre são de fácil compreensão. Na verdade, a igreja primitiva batalhou duramente antes de chegar a uma descrição concisa e precisa da pessoa de Cristo, no Concílio de Calcedônia (451 d.C.).
História: Heróis e Hereges
Cada século, desde o tempo de nosso Senhor e dos Apóstolos em diante, tem testemunhado uma ou mais visões aberrantes sobre Cristo. Sem ser minucioso, no final do primeiro século o erro do docetismo deixou sua marca. Serapião, bispo de Antioquia (190-203), propôs a visão de que a carne de Jesus era “espiritual”. Jesus não tinha uma verdadeira natureza humana, apenas parecia (em grego: dokeo, “parecer”) humano. Esta visão falsa foi defendida por alguns, mesmo enquanto os apóstolos ainda estavam vivos (2Jo 7).
No segundo século, os ebionitas (“os pobres”) rejeitaram a concepção virginal de Jesus. Eles o consideravam o Messias, mas não aceitavam que fosse divino.
O início do terceiro século viu o surgimento de Paulo de Samósata, que foi bispo da igreja de Antioquia (c. 260). Ele tinha uma visão peculiar de Cristo, que incorporava várias heresias. Para ele, Jesus era um homem comum que foi habitado pelo Logos (Verbo) e, assim, tornou-se o Filho de Deus. O Logos que habitava Jesus não era uma pessoa divina distinta do Pai e do Espírito; antes, era o atributo divino do Pai que habitava em Jesus.
Um dos dois principais antagonistas à visão correta sobre Cristo no século IV foi Apolinário de Laodiceia (c. 315-92). Apolinário reagiu, em parte, a outros movimentos heréticos. Em sua reação a uma visão como a de Paulo de Samósata, Apolinário sustentava que o Logos assumira um corpo humano, mas não uma mente humana. Seus adversários responderam corretamente que esta teoria significava que a encarnação seria simplesmente a divindade habitando uma carne sem mente e sem alma. Muitos cristãos hoje caem em um erro semelhante ao pensar que a mente e a alma de Cristo são a sua natureza divina; mas isso é falso. O outro herege desta época foi Ário de Alexandria (c. 250-336). Ele negou que o Logos fosse coigual ao Pai, e sustentou que houve um tempo em que o Filho de Deus não existia.
No século V, uma cristologia mais precisa se estabeleceu, mas apenas depois de muita luta política e teológica. Na verdade, mesmo antes de Calcedônia, houve concílios que buscaram compreender os dados bíblicos sobre a pessoa de Cristo. Durante aquele século, o mais significativo na igreja primitiva para o desenvolvimento da cristologia, teólogos de Antioquia, onde Nestório recebeu seu treinamento, foram muito determinados em fazer jus à plena humanidade de Jesus. Cirilo de Alexandria (c. 376-444), talvez o teólogo mais importante a escrever sobre a pessoa de Cristo na igreja primitiva, apreciava essa preocupação, mesmo que por vezes tenha dito coisas que parecessem contradizer essa crença. De fato, Cirilo e os teólogos de Antioquia estiveram, por um tempo, em certo acordo. Naturalmente, o acordo não era completo; os seguidores mais extremos de Cirilo, como Eutiques, tendiam a “deificar” a humanidade de Cristo.
Tudo isso aponta para o fato de que todos os teólogos até esse ponto tinham em comum a crença nas duas naturezas de Cristo. Suas diferenças, entretanto, estavam na qualidade ou integridade das duas naturezas ao se relacionarem na pessoa de Cristo. Alguns enfatizavam tanto a natureza divina que muito pouco, ou nada, era deixado da natureza humana de Cristo; outros faziam o oposto. Calcedônia parece ter resolvido com grande sucesso os problemas que atormentaram a igreja durante os primeiros cinco séculos.
O credo calcedoniano (451)
À medida que as crises cristológicas do século V continuavam a se intensificar, a imperatriz Pulquéria e o imperador Marciano convocaram um concílio em Calcedônia. O concílio foi rigorosamente monitorado. Não apenas alguns bispos foram autorizados e outros rejeitados, como também certos documentos foram admitidos e outros proibidos. No Concílio de Éfeso (431), o Tomo de Leão, bispo de Roma, não foi admitido. Mas em Calcedônia, o Tomo de Leão foi permitido para que, combinado com as ênfases de Cirilo de Alexandria, se chegasse a algum tipo de declaração em comum. Cirilo, que morreu anos antes de Calcedônia, enfatizou bastante a união das duas naturezas em uma “unidade” impecável (em gregohenosis). A ênfase nas duas naturezas, um produto da cristologia ocidental (típica de Agostinho e outros ocidentais), refletiu uma ênfase de Leão, que também chega até o credo. No parágrafo central de Calcedônia lê-se:
Seguindo os Santos Padres confessamos um e o mesmo, nosso Senhor Jesus Cristo, e todos ensinamos unânimes que o mesmo é perfeito em divindade, o mesmo perfeito em humanidade; verdadeiro Deus e verdadeiro homem; o mesmo de uma alma racional e corpo; consubstancial com o Pai na divindade e também consubstancial conosco em humanidade; semelhante a nós em tudo, exceto no pecado; gerado antes da eras, do Pai na divindade; o mesmo nestes últimos dias, e para nossa salvação, nascido da Virgem Maria Theotokos [“portadora de Deus”] na humanidade; um e o mesmo Cristo, Filho, Senhor, único; reconhecido em duas naturezas, inconfundíveis, imutáveis, indivisíveis, inseparáveis; a diferença das naturezas não sendo de forma alguma desfeita por causa da união, antes o caráter distintivo de cada natureza sendo preservado, combinando-se em uma pessoa e hipóstase; não dividido ou separado em duas pessoas, mas um só e o mesmo Filho e Unigênito Deus, Verbo, Senhor Jesus Cristo; como os profetas do passado e o próprio Senhor Jesus Cristo nos ensinaram a seu respeito, e como o credo dos pais foi entregue a nós.
Esta declaração sobre a pessoa de Cristo permanece sendo uma bela demonstração de ortodoxia, com a qual deve concordar quem deseja permanecer ortodoxo e fiel à totalidade do testemunho bíblico. Ela tem resistido ao teste do tempo. É certo que a definição se presta a interpretações variadas. Por exemplo, teólogos católicos romanos, luteranos e reformados desenvolveram cristologias que não podem ser harmonizadas em alguns pontos. Novamente, se a relação entre as duas naturezas provou-se a fonte de muitos conflitos pré-Calcedônia, não se pode negar que alguns conflitos permanecem até hoje, mesmo que não tenham a ferocidade política da igreja primitiva. Agora, partindo das declarações do credo calcedoniano, vamos procurar dar uma resposta abrangente à pergunta feita por Cristo: “Quem dizem os homens que eu sou?”
Perfeito em divindade
A evidência de que Jesus de Nazaré é plenamente divino, homoousios (uma substância) com Deus, é tão abundante que fica muito difícil simpatizar com aqueles que lutam contra esta verdade. Se Jesus não é plenamente Deus, os escritores do Novo Testamento se esforçaram para confundir e mentir para a igreja (por exemplo, veja Fp 2.5-11; Cl 1; Hb 1).
O prólogo do Evangelho de João fornece evidências explícitas o suficiente para que a igreja possa concluir satisfatoriamente que Jesus é “verdadeiramente Deus”. Considere as palavras de abertura: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus”. Mais adiante no prólogo, João apresenta o ponto surpreendente (talvez o verso mais inacreditável para qualquer judeu do primeiro século): que “o Verbo se fez carne”. A palavra “era” no versículo 1 deve ser contrastada com “se fez” no versículo 14. O Verbo (Logos) não “se fez” no sentido de vir a existir. Ao contrário, o Verbo simplesmente “era”. Outras passagens do Evangelho de João só servem para confirmar e reforçar esta verdade (Jo 3.13; 6.62; 8.57-58; 17.5; 20.28). Além disso, quando Isaías viu “o Rei, o Senhor dos Exércitos” (Is 6.5), João cita uma grande parte desse capítulo e, em seguida, afirma que Isaías disse isso “porque ele viu a glória dele e falou a seu respeito [de Jesus]” (Jo 12.41). Em Isaías, somos informados de que Deus não dá a sua glória a ninguém a não ser a si mesmo; não obstante, em João 17.5, Jesus pede ao Pai para glorificá-lo em sua presença “com a glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse mundo”. Se Jesus não é Deus, então ele não é apenas um iludido, mas seu pedido é uma abominação.
No livro de Apocalipse, há igualmente muitos lugares que demonstram a divindade de Cristo. Ao descrever Jesus no livro de Apocalipse, João claramente faz uma ligação entre Jesus e Yahweh (o Senhor):
“Eu, o Senhor, o primeiro, e com os últimos eu mesmo” (Is 41.4). “Não temas; eu sou o primeiro e o último e aquele que vive” (Ap 1.17-18).
“Eu sou o primeiro e eu sou o último, e além de mim não há Deus” (Is 44.6). “Ao anjo da igreja em Esmirna escreve: Estas coisas diz o primeiro e o último, que esteve morto e tornou a viver” (Ap 2.8).
“Eu sou o mesmo, sou o primeiro e também o último” (Is 48.12). “Eu sou o Alfa e o Ômega, o Primeiro e o Último, o Princípio e o Fim” (Ap 22.13).
Esses paralelos marcantes deixam pouca dúvida quanto ao que o próprio Jesus acreditava ser: ninguém menos que o próprio Yahweh.
Perfeito em humanidade
Jesus não é apenas divino, mas também verdadeiramente humano. Como Calcedônia afirma: “verdadeiro homem; o mesmo de uma alma racional e corpo; […] consubstancial conosco em humanidade; semelhante a nós em tudo, exceto no pecado”. Por isso, ele é chamado de “Cristo Jesus, homem” (1Tm 2.5), que participou de “carne e sangue”, a fim de derrotar o diabo através da morte (Hb 2.14). Ele é semelhante a nós “em todas as coisas” (2.17), até o ponto de ter sido tentado em todas as coisas à nossa semelhança, mas sem pecado (4.15).
A evidência da verdadeira humanidade de Cristo é tão conclusiva quanto a evidência de sua verdadeira divindade. Sendo verdadeiramente humano, Jesus experimentou reações físicas tais como fome (Mt 4.2), sede (Jo 19.28) e fadiga (Jo 4.6). Ele chorou (11.35), pranteou (Lc 19.41), suspirou (Mc 7.34), e gemeu (Marcos 8.12). Como B.B. Warfield disse: “Não falta nada para nos causar a forte impressão que temos diante de nós, em Jesus, um ser humano como nós”.
Mas porque ele era sem pecado, todos as suas paixões eram mantidas em perfeita proporção e equilíbrio. Ele ficou apropriadamente irado quando estava com raiva, bem como completamente alegre quando estava alegre. De fato, ele experimentou “não apenas alegria, mas exultação, não mero aborrecimento irritado, mas furiosa indignação, não mera pena passageira, mas os movimentos mais profundos de compaixão e amor, não mera angústia superficial, mas uma profunda tristeza até a morte, [que ainda assim] nunca o dominaram” (Warfield). Todos os seus afetos foram mantidos em total submissão à vontade de seu Pai.
Nascido da Virgem Maria Theotokos
Como compreendemos o fato de que Jesus é totalmente Deus e totalmente homem? Uma palavra: encarnação (Lc 1.26-38). O maior prodígio de Deus é a encarnação do Filho de Deus. O céu beijou a terra. Consequentemente, o Criador é para sempre identificado com a criatura. Na união das duas naturezas na pessoa de Cristo, vemos eternidade e temporalidade, eterna bem-aventurança e tristeza temporal, onipotência e fraqueza, onisciência e ignorância, imutabilidade e mutabilidade, infinito e finitude. Ou, como Stephen Charnock coloca: “Que Deus sobre um trono seja um infante em um berço; que o trovejante Criador seja um bebê chorando e um homem sofredor são expressões de tão grande poder, bem como de tal amor condescendente, que surpreendem os homens na terra e os anjos no céu”.
Mas o que dizer da linguagem que diz que Maria é Theotokos (a portadora de Deus)? A verdade desta afirmação não deve ser rejeitada por causa de como tem sido mal interpretada pelos católicos romanos e usada para venerar Maria como “Mãe de Deus”. O título de “portadora de Deus” diz algo sobre Jesus, não sobre Maria.
Quando o Filho se fez carne (Jo 1.14), ele assumiu uma natureza humana, não uma pessoa humana. A natureza humana subsiste na personalidade do Filho de Deus: “não dividido ou separado em duas pessoas, mas um só e o mesmo Filho e Unigênito Deus, Verbo, Senhor Jesus Cristo”. Os teólogos chamaram a encarnação do Filho de Deus de “união hipostática”. A união das duas naturezas em uma pessoa significa que, quando falamos de Jesus, não dizemos que sua natureza humana fez isso ou sua natureza divina fez aquilo. Em vez disso, dizemos que Jesus fez isso ou aquilo de acordo com sua natureza humana ou divina. Paulo pontua isto no início de Romanos: “com respeito a seu Filho, o qual, segundo a carne, veio da descendência de Davi” (Rm 1.3).
Aquele que Maria deu à luz não era meramente humano, nem tinha apenas uma natureza humana. Aquele que nasceu de Maria era uma pessoa divina que possuía tanto uma natureza humana quanto uma natureza divina. Essa pessoa é o Filho de Deus, o que significa que Maria pode ser chamada de “a portadora de Deus” desde que fique claro o que isso significa. O título theotokos afirma que Jesus permaneceu completamente divino mesmo ao assumir a natureza humana. Ele não diz que Maria é digna de veneração como “Rainha do Céu” ou como “co-mediadora” com Cristo, como ensina a doutrina católica romana.
O caráter distintivo de cada natureza sendo preservado
A maioria dos teólogos cristãos afirma a distinção entre as duas naturezas de Cristo. Mas como essas duas naturezas referem-se uma à outra tem sido uma fonte de grande disputa entre várias tradições teológicas. Neste ponto, o credo calcedoniano permite uma variedade de interpretações.
Teólogos reformados se apegam à máxima teológica de que o finito (humanidade) não pode conter o infinito (divindade). Esta máxima é verdadeira quanto às duas naturezas de Cristo, mesmo agora no céu. Por essa razão, Cristo tem limitações de acordo com a sua natureza humana. Ele se desenvolveu desde a infância até a idade adulta, e experimentou um crescimento no conhecimento apropriado para cada fase de sua vida (Lc 2.52). Ele teve que ser ensinado por seu pai (Is 50.4-6). De acordo com a sua humanidade, ele teve de se contentar que nem tudo lhe foi revelado durante seu tempo na terra: “Mas a respeito daquele dia e hora ninguém sabe, nem os anjos do céu, nem o Filho, senão o Pai” (Mt 24.36). Ele “aprendeu a obediência” através do sofrimento (Hb 5.8).
Uma vez que a relação entre duas naturezas de Cristo tem sido calorosamente debatida desde Calcedônia, a Confissão de Fé de Westminster (8.7) oferece uma explicação da “comunicação de propriedades” que esclarece o ponto acima: “Cristo, na obra de mediação, age de conformidade com as suas duas naturezas, fazendo cada uma o que lhe é próprio; contudo, em razão da unidade da pessoa, o que é próprio de uma natureza é, às vezes, nas Escrituras, atribuído à pessoa denominada pela outra natureza”. Uma advertência cabe aqui, no entanto. Embora os atributos de qualquer natureza possam ser e são predicados da pessoa, os atributos de cada natureza não podem ser predicados da outra natureza. Por exemplo, Jesus não morreu de acordo com a sua natureza divina, porque não se pode predicar a morte, algo apenas uma natureza humana pode sofrer, à natureza divina. Jesus morreu de acordo com sua natureza humana, mas não com sua natureza divina.
Para se ter uma ideia do que a confissão quer dizer aqui, consideremos Atos 20.28: “Atendei por vós e por todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos constituiu bispos, para pastoreardes a igreja de Deus, a qual ele comprou com o seu próprio sangue”. Neste versículo, a pessoa única de Cristo é denominada pela natureza divina. Em outras palavras, ele é referido como “Deus”, mesmo sendo Deus e homem, divino e humano. Entretanto, por ser um Espírito, Deus não tem sangue. O sangue é próprio apenas da natureza humana, não da natureza divina. O que a confissão está dizendo é que, porque as duas naturezas estão unidas em uma só pessoa, o sangue (que é próprio apenas da natureza humana) é atribuído à pessoa única de Cristo (que neste versículo está sendo chamado ou denominado “Deus”, apesar de o nome de Deus ser próprio apenas da natureza divina). Porque Cristo possui duas naturezas unidas, podemos falar do “sangue de Deus”, já que “o que é próprio de uma natureza é, às vezes, nas Escrituras, atribuído à pessoa denominada pela outra natureza”. Os atributos de qualquer das naturezas podem ser predicados da pessoa de Cristo, mesmo quando Jesus é referido por um nome ou de um modo que é próprio apenas de uma dessas naturezas.
Perguntas especiais
Subordinação: Jesus voluntariamente se submeteu à vontade do Pai. No movimento “alto-baixo-alto” de Filipenses 2.6-11 o Filho de Deus, “subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus” (alto), mas a si mesmo se esvaziou, assumiu a forma de servo, e obedeceu ao Pai até à morte de cruz (baixo), que por sua vez levou à sua exaltação, na qual lhe é dado o nome acima de todo nome (alto). Todas as declarações no Novo Testamento a respeito da “subordinação” de Cristo (Jo 14.28) precisam ser entendidas à luz do acordo entre as pessoas da Trindade, pelo qual o Filho assumiria carne humana e se subordinaria à vontade do Pai.
Impecabilidade: Poderia Jesus, uma vez que foi tentado, ter a possibilidade de pecar? Teólogos têm discordado sobre esta questão, mas a resposta deve ser “não”. Há duas razões por que Jesus não poderia pecar. Primeiro, se Cristo pudesse pecar, então surgiria um problema quanto à relação entre as vontades humana e divina de Cristo. A definição de fé do Sexto Concílio Ecumênico de Constantinopla (680-81) afirma: “E estas duas vontades naturais não são contrárias uma à outra como afirmam os ímpios hereges, mas sua vontade humana segue, não resistindo ou relutante, antes sujeita, à sua vontade divina e onipotente”. A vontade humana não pode ser contrária à vontade divina em Cristo, mas apenas sujeita a ela. Em segundo lugar, por causa da unidade da pessoa, Cristo não poderia pecar sem comprometer a Deus. A natureza humana de Cristo pode ser “pecável” (capaz de pecar); mas uma vez que em sua constituição ele é o Deus-homem, ele é, portanto, uma pessoa impecável.
O Espírito Santo: Se Cristo era completamente divino, por que lemos tantas referências à obra do Espírito Santo sobre ele durante sua vida terrena? Desde o momento da encarnação (Lc 1.31,35), passando por seu batismo (Mc 1.10), sua tentação (Mc 1.12; Lc 4.14), sua pregação (Lc 4.18), a operação de milagres (Mt 12.28), sua morte (Hb 9.14), sua ressurreição (Rm 1.4; 8.11), até sua ascensão e entronização (Sl 45.1-7; At 2.33), descobrimos que o Espírito Santo foi um companheiro constante e inseparável de Cristo.
Cristo escolheu não considerar sua igualdade com Deus como algo a se explorar ou tirar proveito (Fp 2.6). Portanto, em completa dependência do Espírito Santo, Cristo obedeceu ao Pai perfeitamente, sem apego à sua própria natureza divina. Como John Owen argumentou, “O que quer que o Filho de Deus tenha operado em, por ou sobre a natureza humana, ele o fez pelo Espírito Santo”. O Espírito Santo produz em Cristo o fruto do Espírito (Gl 5.22). Assim, os crentes podem esperar não apenas um salvador formidável, que derrotou os poderes das trevas, mas também um salvador misericordioso, paciente, bondoso e amoroso, porque ele é pleno das graças do Espírito Santo. Por causa desta verdade, Thomas Goodwin afirmou que os pecados do povo de Deus movem Cristo mais à compaixão do que à ira. De fato, Goodwin acrescenta: “Se houvesse infinitos mundos feitos de criaturas amorosas, não haveria tanto amor neles como houve no coração do homem Cristo Jesus”.
Conclusão
Por causa da entrada do pecado no mundo através do homem, o homem deve prestar reparação a Deus. Mas o homem pecador não pode reparar o dano pelo seu pecado. Um mero homem sem pecado só poderia, potencialmente, fazer restituição por um homem pecador. Reparação por muitos homens (“como a areia da praia”) só pode acontecer através do Deus-homem, Jesus Cristo, por causa do valor infinito de sua pessoa. Ele é o Messias designado por Deus, o único que pode trazer a salvação para os pecadores por meio de sua morte e ressurreição. Pedro reconheceu essa grande verdade, para seu grande benefício. Pela fé, Pedro confessou Jesus como o Cristo, o Filho de Deus (Mt 16.16). Pela visão, Pedro agora contempla a glória de Deus na face de Jesus Cristo. Aqueles que contemplam a glória de Deus na face de Jesus Cristo nesta vida, pela fé (2Co 3.18), podem confiantemente esperar fazer o mesmo na vida por vir, por vista (5.7). Essa é a nossa esperança; essa é a nossa alegria. É por isso que a única esperança para a igreja hoje não é um mero homem, mas o Deus-homem, que pergunta a você: “Quem dizes que eu sou”?
Por: Mark Jones. © 2014 Ligonier Ministries. Original: A Summary of Orthodox Christology.
Este artigo faz parte da edição de dezembro de 2014 da revista Tabletalk.
Tradução: João Paulo Aragão da Guia Oliveira. Revisão: Vinicius Musselman. © 2016 Ministério Fiel. Todos os direitos reservados. Website: MinisterioFiel.com.br. Original: Um Resumo da Cristologia Ortodoxa.
Permissões: Você está autorizado e incentivado a reproduzir e distribuir este material em qualquer formato, desde que informe o autor, seu ministério e o tradutor, não altere o conteúdo original e não o utilize para fins comerciais.
Fonte: Voltemos ao Evangelho
Hebreus, Judeus e Israelitas
De um modo geral, os termos hebreus, judeus e israelitas, todos se referem ao mesmo grupo de pessoas – a nação que nasceu de Abraão através de Isaque e Jacó, uma nação prometida e escolhida por Deus no Antigo Testamento (Gênesis 12:1-3). Cada termo enfatiza algum aspecto da origem deste povo.
O termo HEBREU é utilizado pela primeira vez nas escrituras para se referir a Abraão (Gênesis 14:13). Em seguida, ele é usado para se referir a José (Gênesis 39:14,17) e aos outros descendentes de Abraão através de Isaque e Jacó (Gênesis 40:15; 43:32). É incerto porque Abraão é chamado de Hebreu. “Alguns sugeriram que a palavra “HEBREU” significa” do outro lado “ou” o que cruza de um ponto a outro, em alusão a Abraão deixando Ur e cruzando o rio Eufrates. Além disso, nenhuma outra razão especial é dada nas escrituras para chamar a nação que veio de Abraão, Isaque e Jacó de Hebreus. O termo, no entanto, identifica a nação como descendentes de Abraão. Tem sido sugerido por alguns que Hebreus é o nome nacional, que foi preferido por esta nação e o nome pelo qual as nações estrangeiras, muitas vezes se referem a eles.
O nome de Jacó, filho de Isaac (Gênesis 25:26), que era o filho prometido de Abraão (Gênesis 17:19), foi mudado para Israel quando ele lutou com um homem de Deus (Gênesis 32:28). Assim, os descendentes de Abraão através de Isaque e Jacó (Israel) compunham a nação de Israel e às vezes eram chamados israelitas (Êxodo 9: 7). Quando a nação se dividiu, as dez tribos do norte arrogou para si o nome de Israel, e as duas tribos do sul se tornou conhecida como Judá. Ambas as nações foram levadas cativas; Israel foi levado cativo pelos assírios e a de Judá foi mais tarde levado cativo pelos babilônios. Quando o cativeiro babilônico terminou, os exilados de ambas as nações- Israel e Judá- retornaram à sua terra natal e foram novamente unidas sob a designação de Israel.
O termo judeus foi utilizado pela primeira vez para descrever os habitantes de Judá, o nome tomado pelas duas tribos do sul da nação de Israel durante a divisão (2 Reis 6: 6; 25: 25). Depois do cativeiro babilônico, o significado foi estendido para abraçar a todos de Israel. É sugerido por alguns que este nome pode ter sido dado a todo o Israel neste momento porque a maior porção do remanescente do povo da aliança eram de Judá (New Unger Dicionário Bíblico). Judeus são muitas vezes usados para contrastar ou para distinguir esta nação dos samaritanos, gentios, ou prosélitos (João 4: 9; Romanos 2: 9; Atos 2:10).
Todos esses três termos continuaram a ser usados no Novo Testamento para descrever os descendentes carnais de Abraão através de Isaque e Jacó (2 Coríntios 11:22; João 4: 9). Além disso, uma vez que os israelitas eram o povo escolhido de Deus do Antigo Testamento, no Novo Testamento, os termos judeu e Israel são ocasionalmente usados figurativamente para representar o povo escolhido de Deus hoje – a semente espiritual de Abraão, a igreja (Gálatas 3:29; Romanos 2 : 27,28; 9: 6). Um estudo cuidadoso do contexto das passagens do Novo Testamento permitirá discernir o caminho que os termos são usados no Novo Testamento e de quem eles falam.
Os termos hebreus, israelitas e judeus são sinônimos próximos e são muitas vezes utilizados alternadamente. Todos os três termos se referem aos que têm descendentes de Abraão através de Isaque e Jacó. Os termos são usados em sentido figurado algumas vezes no Novo Testamento, em referência à semente espiritual de Abraão. Quando se fala da nação carnal de Israel, o termo hebraico amarra as pessoas diretamente a Abraão; Israelitas relaciona-os com Jacó, ou Israel, e judeus ou judeus nos lembra da terra natal deste povo e é usado para distinguir a raça de outras pessoas ou para contrastá-los com os outros.
Review: What Is a Healthy Church?
10 de setembro de 2016
A Conversão e o Novo Testamento
Thomas R. Schreiner
Conversão pode ser definida como voltar-se do pecado e voltar-se para Deus. Talvez o versículo clássico que captura essa definição é 1 Tessalonicenses 1.9: “pois eles mesmos, no tocante a nós, proclamam que repercussão teve o nosso ingresso no vosso meio, e como, deixando os ídolos, vos convertestes a Deus, para servirdes o Deus vivo e verdadeiro.” Aqui vemos claramente os dois elementos da conversão, voltar-se para Deus e voltar-se dos ídolos.
Conversão no Novo Testamento: da promessa para realidade
A história do triunfo de Deus sobre a serpente prometida no Antigo Testamento (Gn 3.15) torna-se uma realidade no Novo Testamento. O Antigo Testamento promete uma nova aliança, uma nova criação, um novo êxodo e novos corações para o povo de Deus. E nele é inaugurado o cumprimento para todas essas promessas através da vida, morte e ressurreição de Jesus Cristo, que é proclamada no Novo Testamento.
Conversão nos Sinóticos
Nos Evangelhos sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas), a obra salvadora de Deus prometida do Antigo Testamento é englobada pelo termo “reino de Deus”. O reino de Deus exerce um papel central nos sinóticos, mas também devemos entender que o reino de Deus convoca os homens à conversão. Os dois elementos da conversão podem ser descritos em termos de arrependimento e fé. Conforme lemos em Marcos 1.14-15: “foi Jesus para a Galiléia, pregando o evangelho de Deus, dizendo: O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no evangelho.” (cf. Mateus 4.17). As boas novas do retorno do exílio anunciado por Isaías, as boas novas do cumprimento das promessas de salvação de Deus serão desfrutadas somente por aqueles que se arrependerem de seus pecados e crerem no evangelho.
O evangelho nos sinóticos está centrado na morte de ressurreição de Jesus, porque a paixão e a ressurreição de Jesus dominam a história em todos os três livros. É o clímax da história! Não há reino sem a cruz. Jesus veio para “salvar seu povo dos seus pecados” (Mateus 1.21) e essa salvação é realizada somente através da sua morte em favor deles, na qual ele deu “sua vida em resgate por muitos” (Mateus 20:28; cf Marcos 10:45). Alguns que falam acerca do reino falam pouco sobre conversão, mas até mesmo uma rápida olhada nos evangelhos sinóticos indica que conversão é fundamental. Ninguém poderá entrar no reino sem ela (cf. Marcos 10.17-31).
Conversão em João
A centralidade da conversão também é evidente no evangelho de João. De fato, João escreveu seu evangelho para que o povo pudesse “crer que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenham vida em seu nome “ (João 20.31). João usa o verbo “crer” 98 vezes no evangelho, ressaltando a importância desse tema em seu evangelho. Crer não é um ato passivo em João. João usa uma variedade de termos para comunicar a profundidade e atividade da fé: crer é como comer, beber, ver, ouvir, habitar, vir, entrar, receber e obedecer. A natureza radical da conversão é expressa através de vários verbos que João usa para descrever o que significa crer que Jesus é o Cristo. Conversão, então, está no âmago da mensagem do evangelho de João. Vida eterna (vida na era do porvir) pertence somente àqueles que creem em Jesus como o “cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo (Jo 1.29). Em outras palavras, somente aqueles que são convertidos desfrutam vida eterna.
Conversão e o Reino em Atos
Parece claro a partir da discussão acima que conversão exerce um papel central nos evangelhos e podemos traçar a mesma conclusão a partir do livro de Atos. Em Atos, achamos uma variedade de sermões nos quais o evangelho é exposto aos ouvintes (por exemplo, Atos 2.14-41; 3.11-26; 13.16-41). Aqueles que ouviam eram geralmente convocados a arrepender-se (Atos 2.38; 3.19; 8.22; 17.30; 26.20), que também é definido como “voltar-se” para Deus (Atos 3.19; 9.35, 40; 11.21; 14.15; 15.19; 26.18, 20; 28.27) A mensagem do evangelho envolve um chamado urgente para voltar-se contra o pecado e aquela antiga vida. Ao mesmo tempo, aqueles que ouviam as boas novas eram convocados para crer e exercitar fé (Atos 16.31; 26.18) De fato, a palavra “crer” é usada aproximadamente 30 vezes em Atos para descrever cristãos, indicando que fé caracteriza aqueles que pertencem a Cristo.
Não é tão surpreendente que conversão exerça um papel principal em Atos, já que o livro registra o expansão do evangelho de Jerusalém a Roma (Atos 1.8; cf. também 1.6; 14.22). Porém, deve ser também notado que o reino de Deus é um tema principal em Atos. Ele emoldura o livro no começo (Atos 1.3) e no fim (Atos 28.31). Paulo pregou o evangelho em Roma (Atos 20.35; 28.23, 31) e Filipe “que os evangelizava a respeito do reino de Deus e do nome de Jesus Cristo” (Atos 8.12), demonstrando que o reino está centrado no evangelho. O evangelho que foi proclamado convocava os ouvintes, como vimos acima, ao arrependimento e à fé. Consequentemente, temos outra parte de evidência que a conversão é fundamental para qualquer proclamação do reino. A restauração do mundo para a regência de Deus é a esperança gloriosa dos crentes, mas somente aqueles que se arrependeram e creram desfrutarão o novo mundo que está porvir. Aqueles que se recusam a acreditar, como Atos enfatiza frequentemente, serão julgados.
Conversão em Paulo
Paulo não usa o termo reino de Deus frequentemente, mas sua cosmovisão escatológica é bem conhecida e está de acordo com o caráter escatológico do reino. Como os evangelhos, ele proclama uma escatologia “já/ainda não”. A maioria dos eruditos concordariam que fé e arrependimento são temas cruciais nas epístolas paulinas. Paulo comumente ensina que justificação e salvação são obtidas somente pela fé (cf. Romanos 3.21-4.25; 9.30-10.17; 1 Coríntios 15.1-4; Gálatas 2.16-4.7; Efésios 2.8-9; Filipenses 3.2-11). Ele não utiliza a palavra arrependimento tão frequentemente, mas não é completamente ausente (por exemplo, Romanos 2.4; 2 Coríntios 3.16, 1 Tessalonicenses 1.9; 2 Timóteo 2.25). Paulo usa muitos termos para obra da salvação de Deus em Cristo, incluindo salvação, justificação, redenção, reconciliação, adoção, propiciação e assim por diante. É incontestável que a obra de salvação de Deus em Cristo exerce um papel principal na teologia paulina, mas tal salvação é garantida somente para aqueles que creem, para aqueles que são convertidos.
De acordo com Paulo, os crentes esperam ansiosamente pelo retorno de Jesus Cristo e a restauração da criação (Romanos 8.18-25; 1 Tessalonicenses 1.10); e, no entanto, somente aqueles que são convertidos pertencerão à nova criação que está porvir. Consequentemente, Paulo trabalha intensivamente para espalhar o evangelho entre os gentios (Colossenses 1.24-2.5), lutando para trazer o evangelho àqueles que nunca ouviram (Romanos 15.22-29), então eles estarão no grupo dos que são salvos.
Conversão nas epístolas gerais
As cartas restantes do Novo Testamento são escritos ocasionais endereçados a situações específicas. Ainda assim, a importância da conversão é estabelecida ou implícita. Por exemplo, achamos em Hebreus que somente aqueles que creem e obedecem entrarão no descanso do fim dos tempos (Hebreus 3.18-19; 4.3; 11.1-40). Tiago tem sido comumente mal compreendido, mas, quando corretamente interpretado, ele ensina que uma fé contrita é necessária para justificação (Tiago 2.14-26). Assim também, Pedro ensina que a salvação é pela fé (1 Pedro 1.5; 2 Pedro 1.1) e 1 João foi escrito para assegurar aos crentes que possuem vida eterna (1 João 5.13).
Conversão em Apocalipse
O livro do Apocalipse culmina a história, assegurando crentes que o reino de Deus, que já veio em Jesus Cristo, será consumado. Aqueles que praticam mal e se comprometem com a Besta serão julgados para sempre, mas aqueles que perseverarem até o fim entrarão na cidade celestial, que é a nova Jerusalém. Apocalipse ressalta que somente aqueles que se arrependerem ( Apocalipse 2.5, 16, 21, 22; 3.3, 19; 9.20-21; 16.9, 11) encontrarão vida.
Não o tema central, mas fundamental para a história completa
Para resumir, conversão certamente não é o tema central das Escritruras. Crentes foram feitos para glorificar a Deus e desfrutá-lo para sempre, e nós faremos isso tanto neste mundo quanto no mundo porvir.
Mas conversão é fundacional e fundamental para a história, visto que somente aqueles que são convertidos desfrutarão a nova criação. Seres humanos devem voltar-se do pecado e voltar-se para Deus para serem salvos. Eles devem arrepender-se dos seus pecados e crer no evangelho de Jesus Cristo, crucificado e ressurreto. Será pouco consolador no último dia se alguém tiver contribuído de uma pequena forma ou mesmo uma forma significativa para a melhoria desse mundo (tão útil quanto seja), se não for convertido.
Tradução: Matheus Fernandes Freitas de Castro
Revisão: Vinicius Musselman
O significado bíblico de “mundo” em João 3.16
Uma das guinadas mais surpreendentes de João 3.16 é que somos informados que Deus ama o mundo. Podemos ser tentados a pensar que há muitas coisas no mundo para Deus amar. Afinal de contas, como não admirar as paisagens urbanas e rurais, alta gastronomia e churrascos de quintal, sinfonias clássicas e música popular, pinturas renascentistas e rabiscos de jardim de infância? O mundo que conhecemos está repleto de texturas, desafios, oportunidades e alegrias. O problema é que tudo o que é bom, interessante e bonito no mundo está saturado de pecadores. Desde que Adão e Eva se rebelaram contra Deus no jardim, o mundo se tornou uma terra desolada. Não obstante quão maravilhoso o mundo pareça, ele não é digno do amor redentor de Deus.
Entender como o mundo é indigno do amor de Deus é a chave para João 3.16. Só assim apreciaremos o presente inesperado que Deus dá. Este ponto foi bem estabelecido há muitos anos pelo estimado teólogo Benjamin Breckinridge Warfield. Em seu sermão “O incomensurável amor de Deus”, Warfield investiga o significado do termo “mundo” (em grego kosmos) em João 3.16, a fim de sondar as profundezas do amor de Deus.
Qual é o significado de “mundo” nesta passagem? A partir das ideias de Warfield, encontramos quatro respostas possíveis.
Em primeiro lugar, muitas pessoas acreditam que “mundo” significa todas as pessoas, sem exceção. Em outras palavras, quando João 3.16 diz que Deus ama o mundo, isso significa que ele ama todas as pessoas, uma por uma, de forma igual. A lógica é algo deste tipo: Deus ama todas as pessoas; Cristo morreu por todas as pessoas; portanto, a salvação é possível para todas as pessoas. No entanto, essa visão parece sugerir que o amor de Deus é impotente, e que a morte de Cristo é ineficaz. Caso contrário, a conclusão natural desta posição seria a de que todas as pessoas são efetivamente salvas, em vez de apenas potencialmente salvas. Se Deus ama todas as pessoas, e Cristo morreu por todas as pessoas; se o amor de Deus não é impotente, e morte de Cristo não é ineficaz, então a única conclusão a que se pode chegar é que a salvação é assegurada para todas as pessoas. No entanto, este ponto de vista contradiz o ensino da Bíblia sobre o julgamento de Deus, tal como é evidenciado pelo contexto imediato em João 3.17-21.
Em segundo lugar, outros argumentam que “mundo” significa todas as pessoas, sem distinção. Esta opção enfatiza que Deus ama mais de um tipo de pessoa ou grupo étnico. A morte de Cristo na cruz não foi apenas por judeus, mas também por gentios. O amor de Deus não se restringe a fronteiras nacionais, mas se estende a todos os tipos de nações, tribos, culturas, línguas e povos. A isso, todo o povo de Deus (tanto arminianos quanto calvinistas) diz um caloroso “Amém”. Apesar de este ponto de vista ter a vantagem de estar, sem dúvida, certo e de se encaixar dentro do contexto maior do evangelho de João sobre a identidade global dos “filhos de Deus” (por exemplo, João 1.9-13; 4.42), ele não chega a capturar o forte contraste entre “Deus amou” e “o mundo” que João 3.16 deliberadamente evoca.
Em terceiro lugar, uma nuance popular da opção anterior entre os teólogos reformados é argumentar que “mundo” em João 3.16 se refere aos eleitos. Ao longo de todo o Evangelho de João, Jesus enfatiza a particularidade de sua graça. “Todo aquele que o Pai me dá, esse virá a mim” (6.37). “Eu sou o bom pastor; conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem a mim […] e dou a minha vida pelas ovelhas” (10.14-15). ”Se vós fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu; como, todavia, não sois do mundo, pelo contrário, dele vos escolhi, por isso, o mundo vos odeia” (15.19). “É por eles que eu rogo; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus” (17.9). E assim por diante. O ponto é que o povo de Deus é escolhido de um mundo descrente. Novamente, este ponto de vista possui um tom importante ao destacar a doutrina bíblica da eleição, mas o foco do termo “mundo” em João 3.16 não é tanto sobre a identidade do povo de Deus, mas sobre a natureza do amor de Deus.
Isso nos leva à opção final. Uma defesa consistente pode ser feita para crermos que “mundo” se refere à qualidade do amor de Deus. Warfield declara de forma convincente:
[Mundo] não é aqui tanto um termo de extensão; antes, é um termo de intensidade. Sua conotação primária é ética, e o objetivo de seu emprego não é sugerir que o mundo é tão grande que é preciso uma grande dose de amor para abarcá-lo completamente, mas que o mundo é tão ruim que é preciso um grande tipo de amor para poder amá-lo, e sobretudo para amá-lo como Deus o amou quando deu o seu Filho por ele.
O mundo representa a humanidade pecadora, e não é digno do amor salvífico de Deus. Fora do amor de Deus, o mundo está sob a sua condenação. Mas em Cristo, os crentes experimentam o amor surpreendente, redentivo e infinito de Deus. João 3.16 não diz respeito à grandeza do mundo, mas à grandeza de Deus.
Fonte: Voltemos ao Evangelho
Por: John Tweeddale. © 2016 Ligonier. Original: The World
Este artigo faz parte da edição de Maio de 2016 da revista Tabletalk.
Tradução: João Paulo Aragão da Guia Oliveira. Revisão: Yago Martins. © 2016 Ministério Fiel. Todos os direitos reservados. Website: MinisterioFiel.com.br. Original: O significado bíblico de “mundo” em João 3.16
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Nota Pública sobre Debates Teológicos entre Calvinistas e Arminianos
6 de setembro de 2016
Diante da recorrência de discussões e ataques pessoais realizados no âmbito eclesiástico, na internet e nas redes sociais, especialmente entre calvinistas e arminianos para a defesa de posições teológicas, NÓS, abaixo subscritos, vimos a público emitir a presente nota:
Reconhecemos a importância e a historicidade do debate teológico dentro da tradição cristã como meio de defesa e salvaguarda da verdade e, consequentemente, da ortodoxia bíblica.
Apoiamos a produção e a reflexão teológica realizada no ambiente da internet, em virtude de seu caráter democrático e do livre curso de ideias, como corolário da Reforma Protestante.
Repudiamos, todavia, que para a defesa de posições teológicas haja discussões e ataques pessoais realizados em nome da fé, que promovem dissensões, inimizades e escândalo ao nome de Cristo. Rejeitamos, assim, todo e qualquer conteúdo difamatório, ofensivo e jocoso, ainda que a pretexto do humor, produzido contra irmão de vertente religiosa diversa, que atente contra sua honra e imagem.
Entendemos incompatíveis com os preceitos que devem reger a conduta dos discípulos do Mestre posturas antiéticas que estimulam a zombaria, o desrespeito e o escárnio, baseado em dolo, distorções e mentiras.
Discordamos das publicações anônimas, especialmente quando realizadas com o objetivo de provocar animosidade e discórdia entre os cristãos. Além de ser proibido constitucionalmente (Art. 5o, IV), o anonimato atenta contra os princípios bíblicos da transparência (2Co 3.18), sinceridade (Tt 2.7) e honestidade (1Tm 2.2).
Relembramos que a calúnia, a injúria e a difamação são crimes contra a honra, de acordo com o Código Penal Brasileiro, os quais não se coadunam com o caráter do verdadeiro cristão, que deve expressar o fruto do Espírito (amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança), conforme Gálatas 5.22.
Aconselhamos os cristãos piedosos a não dar audiência a páginas e grupos que promovam tais ofensas.
Defendemos e incentivamos a exposição de convicções cristãs, bem como o debate teológico na internet e nas redes sociais, de modo irênico, ou seja, de espírito pacífico (Rm 12.18), com cordialidade e respeito. A discordância e a confrontação das ideias alheias, quando for o caso, devem ser conduzidas com ética, honestidade intelectual e de maneira objetiva, sem denegrir e atacar o oponente.
Asseveramos que a produção teológica é, sobretudo, um ato de glorificação a Deus. Discussões, pois, que se desenvolvem com o único propósito de vencer desavenças intelectuais, baseadas em disputas do ego, estão longe de honrar o nome de Cristo. A determinação bíblica de “falar o que convém à sã doutrina” (Tt 2.1) exige coragem, mas também responsabilidade, para os cristãos em geral e os pastores em particular, os quais devem ser, dentre outras coisas, “irrepreensíveis, honestos, moderados, aptos a ensinar, não contenciosos…” (1 Tm 3.2,3).
Citamos, a propósito, as palavras de J.I. Packer: “Se a nossa teologia não nos reaviva a consciência nem amolece o coração, na verdade endurece a ambos; se não encoraja o compromisso da fé, reforça o desinteresse que é próprio da incredulidade; se deixa de promover a humildade, inevitavelmente nutre o orgulho. Assim, aquele que expõe teologia em público, seja formalmente, no púlpito ou pela imprensa, ou informalmente, em sua poltrona, deve pensar muito sobre o efeito que seus pensamentos terão sobre o povo de Deus e outras pessoas”.
Recomendamos, assim, a importância da constante elevação bíblica e espiritual do nível dos debates teológicos. E caso nos deparemos com um irmão em Cristo com postura inadequada e não condizente com a ética e pratica cristãs, que ele seja repreendido, mas que em tal ato não falte educação e principalmente amor.
Reconhecemos as diferenças marcantes historicamente existentes entre as tradições calvinistas e arminianas, notadamente em referência à doutrina da salvação. Todavia, tais divergências teológicas não suplantam a comunhão cristã que deve haver entre os irmãos dessas duas vertentes da cristandade. Em uníssono, à luz das Escrituras Sagradas, enfatizamos que a salvação somente se alcança em Cristo somente, mediante a graça somente, pela fé somente (Rm 3.24; Ef 2.8; Tt 2.11).
Finalizamos com a menção ao episódio em que o calvinista George Whitefield foi perguntado se esperava ver o arminiano John Wesley nos céus. Sua resposta foi: “Não. John Wesley estará tão perto do Trono da Glória, e eu tão longe, que dificilmente conseguirei dar uma olhadela nele”. Assim se tratam verdadeiros cristãos que discordam em questões de soteriologia, mas que não fazem nada por contenda ou vanglória, e consideram os outros superiores a si mesmos (Fp 2.3). E, sobretudo, estes sabem o preço custoso com que foram comprados por Cristo Jesus.
18 de janeiro de 2015.
- Augustus Nicodemus Lopes, pastor da Primeira Igreja Presbiteriana de Goiânia-GO.
- Altair Germano, pastor da Assembleia de Deus – Itália, escritor.
- Carlos Kleber Maia, pastor da Assembleia de Deus – RN, escritor de obra arminiana.
- César Moisés de Carvalho, pastor da Assembleia de Deus, teólogo, escritor.
- Ciro Sanches Zibordi, pastor da Assembleia de Deus na Ilha da Conceição em Niterói – RJ, escritor e articulista.
- Clóvis José Gonçalves, membro da igreja O Brasil para Cristo e editor do blog Cinco Solas.
- Davi Charles Gomes, Chanceler da Universidade Presbiteriana Mackenzie-SP.
- Euder Faber Guedes Ferreira, pastor, presidente da VINACC (Visão Nacional para a Consciência Cristã).
- Solano Portela Neto, presbítero da Igreja Presbiteriana do Brasil, conferencista e autor reformado.
- Franklin Ferreira, pastor batista, diretor geral do Seminário Martin Bucer-SP.
- Geremias do Couto, pastor da Assembleia de Deus, escritor.
- Glauco Barreira Magalhães Filho, pastor batista – CE, professor universitário, escritor.
- Gutierres Fernandes Siqueira, membro da Assembleia de Deus – SP, editor do blog Teologia Pentecostal.
- Helder Cardin, pastor batista, reitor do Seminário Palavra da Vida-SP.
- Jamierson Oliveira, pastor batista, teólogo, escritor.
- Jonas Madureira, pastor batista, editor de Edições Vida Nova e professor do Seminário Martin Bucer.
- José Gonçalves, pastor da Assembleia de Deus – PI, teólogo, escritor.
- Magno Paganelli, pastor da Assembleia de Deus – SP, teólogo, escritor.
- Marcos Antônio Moreira Guimarães, professor de teologia, obreiro da Assembleia de Deus – MT.
- Mauro Fernando Meister, diretor do Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper-SP.
- Norma Cristina Braga Venâncio, escritora, membro da Igreja Presbiteriana do Pirangi, Natal-RN.
- Paulo Romeiro, pastor, teólogo, escritor.
- Renato Vargens, pastor da Igreja Cristã da Aliança de Niterói-RJ.
- Solon Diniz Cavalcanti, pastor, teólogo, presidente do CEAB Transcultural.
- Thiago Titillo, pastor batista, professor, escritor.
- Tiago José dos Santos Filho, pastor batista, editor-chefe da Editora Fiel, diretor pastoral do Seminário Martin Bucer-SP.
- Uziel Santana, presidente da Anajure (Associação Nacional de Juristas Evangélicos).
- Valdeci do Carmo, obreiro da Assembleia de Deus, teólogo, coordenador do curso de Teologia das Faculdades Feics, Cuiabá/MT.
- Valmir Nascimento Milomem Santos, teólogo da Assembleia de Deus, professor universitário, editor da revista Enfoque Teológico.
- Wallace Sousa, evangelista da Assembleia de Deus, DF, escritor, pós-graduado em teologia, coordenador da União de Blogueiros Evangélicos.
- Wellington Mariano, pastor da Assembleia de Deus, escritor e tradutor de obras arminianas.
- Wilson Porte Junior, pastor batista e professor do Seminário Martin Bucer.
- Zwinglio Rodrigues, pastor batista, escritor de obra arminiana.
Fonte: Voltemos ao Evangelho
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